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PATENTE

UFRB e parceiros inovam em sínteses de compostos químicos no tratamento da ansiedade

30/07/24 15:56 , 31/07/24 14:05 | 1568
A imagem mostra um fundo abstrato em tons de azul claro e branco, com várias formas hexagonais interconectadas por linhas finas. Essas formas lembram estruturas moleculares ou redes de conexões. Há também pontos de luz brilhantes espalhados pela imagem, criando um efeito de brilho e profundidade. A sensação geral é de algo tecnológico ou científico.

Pesquisadores do Grupo de Materiais Fotônicos (GMF), da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB), e das Universidades Estadual Vale do Acaraú (UVA), da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (Unilab), Estadual do Ceará (UECE) e Estadual de Santa Cruz (UESC) desenvolveram uma nova abordagem para o tratamento da ansiedade, um problema de saúde mental crescente no Brasil e no mundo. 

A equipe de pesquisa é composta pelos professores e pesquisadores Jorge Fernando Silva de Menezes, líder do Grupo de Materiais Fotônicos, do Centro de Formação de Professores (CFP/UFRB), do Campus Amargosa; Hélcio Silva dos Santos, da UVA; Aluísio Marques da Fonseca, da Unilab; Emmanuel Silva Marinho, Maria Kueirislene Amâncio Ferreira e Jane Eire Silva Alencar de Menezes, da UECE; e o mestrando Andrei Marcelino Sá Pires Silva, da UESC.  

Denominada "Obtenção dos complexos de coordenação de Európio (Eu³⁺) e Térbio (Tb³⁺) combinados com ligantes β-dicetonatos, sulfóxidos, fármacos e naftoquinonas com finalidade ansiolítica", a invenção foi patenteada no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI). Entre as exigências para registro de patente estão novidade, inventividade e aplicação industrial.  

“O aumento significativo no uso de ansiolíticos no Brasil destacou a necessidade de novas abordagens terapêuticas. A demanda por novos tratamentos é urgente”, explica o professor e pesquisador da UFRB, Jorge Menezes. Somente no país,  especialmente após a pandemia de COVID-19, a ansiedade tem afetado de crianças a idosos, com o consumo de medicamentos ansiolíticos registrando aumento de 10% entre 2019 e 2022, de acordo com o Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos. Em busca de alternativa aos medicamentos convencionais, a pesquisa focou em compostos químicos inovadores, como os elementos terras raras, que até agora não foram amplamente explorados para esse fim.  

Os cientistas começaram a pesquisa com simulações computacionais para prever como os compostos poderiam interagir com proteínas associadas à ansiedade. Esses modelos teóricos foram seguidos por experimentos práticos, incluindo a síntese dos compostos e testes em modelo animal, como o peixe Zebrafish (Danio rerio), que é amplamente utilizado em pesquisas sobre toxicidade e comportamento.  

As etapas envolvidas iniciam-se na produção de nove materiais: [Eu(LAP)3.2H2O], [Tb(BTFA)3.2H2O], [Tb(ACAC)3.3H2O], [Eu(DBM)3.2H2O], [Eu(DBM)3.2PTSO], [Eu(TTA)3.(AMX)], [Eu(DBM)3.(LAP)], [Eu(TTA)3.(AMX)2], [Eu(BTFA)3.(AMX)] e [Tb(BTFA)3.(AMX)]. "Depois, todos os materiais foram caracterizados para determinação da estrutura e propriedades físico-químicas, para as quais lançamos mão de uma série de técnicas, como espectroscopia de infravermelho, análise elementar, espectroscopia de fotoluminescência, absorção eletrônica e outras", explicou Jorge Menezes. 

"Então, caracterizados os materiais, seguimos com o planejamento e execução da avaliação da eficácia farmacológica, que ocorreram em duas etapas principais: estudo in silico, que compreende a modelagem molecular a partir de um estudo por método teórico de simulação computacional; e estudo in vivo, validado pelo método usando a espécie Zebrafish (Danio rerio)", detalhou o pesquisador da UFRB.  

Para o professor e pesquisador Aluísio Marques (Unilab), "essa etapa foi validada em comparação com referência positiva. No caso, os complexos que foram sintetizados apresentaram efeitos muito similares ao medicamento Diazepam no tratamento da ansiedade, tanto no estudo in vivo como in silico". Aluísio Marques destaca o pioneirismo do professor Jorge Menezes, "que sempre realizou síntese com complexos com európio e me apresentou a estrutura de alguns de seus complexos".   

Aluísio explica que seu papel foi fazer "algumas simulações computacionais por meio de docking e dinâmica molecular, usando como alvo as proteínas responsáveis pela replicação do fungo Candida auris, do vírus Sars Cov-2, e dos efeitos da ansiedade, o qual nos rendeu dois artigos científicos". 

O grupo de pesquisadores pensou em abordar também, em paralelo, estudo in vivo, com a expertise dos pesquisadores Jane Eire Silva Alencar de Menezes e Hélcio Silva dos Santos, sobre a ansiedade, do qual eles possuem o modelo. "Deste modo, os resultados do estudo in vivo bateram com os estudos teóricos", descreveu Aluísio Marques.  

Segundo Jorge Menezes, os novos compostos produzidos, caracterizados e testados em ensaios in silico e in vivo apresentam atividade ansiolítica acentuada em comparação com o padrão utilizado nos ensaios, o que coloca a descoberta em uma fase testes de viabilidade para uso, uma vez que, já atestada a atividade farmacológica pretendida, o próximo passo é viabilizar o uso.  

Jorge Menezes afirma que o ponto mais importante da descoberta é o desenvolvimento de uma nova classe de fármacos, que sai das variantes de compostos benzodiazepínicos que são convencionalmente utilizados como ansiolíticos. Os novos materiais oferecem uma alternativa viável química e economicamente para o desenvolvimento de fármacos, gerando novas possibilidades de atuação e combate dos transtornos de ansiedade por vias até então pouco exploradas. "Pensando no uso terapêutico, a pesquisa usando complexos tem o objetivo de garantir a atividade farmacológica enquanto reduz os níveis de citotoxicidade inerente destes metais e dos ligantes aos quais estão combinados, gerando materiais robustos, quimicamente estáveis e eficazes", destaca o pesquisador da UFRB.  

Nesse sentido, Aluísio Marques explica que a descoberta de novos fármacos é um processo complexo e multidisciplinar que envolve várias etapas, desde a identificação de alvos biológicos até a aprovação clínica e comercialização do medicamento. "Portanto, é colaborativo, envolvendo cientistas de diversas áreas, como Química, Biologia, Farmacologia e Medicina", afirma Aluísio. Para ele, "além disso, é uma área de intensa inovação tecnológica, com avanços em biotecnologia, inteligência artificial e análise de dados, contribuindo para acelerar a descoberta e desenvolvimento de novos medicamentos".  Aluísio Marques destaca que a descoberta dos pesquisadores obteve um efeito inédito no uso de complexos inorgânicos com európio no tratamento da ansiedade, apesar de existirem relatos de seu uso em outros problemas de saúde".  

Resultados e potencial 

Além dos testes mostrarem que os novos compostos podem ser tão eficazes quanto ansiolíticos já comercializados, também apontam  novas possibilidades no desenvolvimento de fármacos.  Desse modo, Jorge Menezes pontua que embora os ansiolíticos possuam úteis efeitos medicinais, "podem causar efeitos indesejáveis como a dependência química, a pesquisa visa um novo caminho no tratamento de doenças relacionadas à ansiedade e, pela característica intrínseca dos materiais produzidos, diversas possibilidades no estudo e compreensão da atividade ansiolítica que possam minimizar/diminuir tal efeito".  

Os pesquisadores destacam que, apesar dos resultados promissores, a descoberta ainda está em fase de testes e necessita de validações adicionais antes de uma possível aplicação clínica. “Nos próximos passos, vamos otimizar os processos de síntese e buscar parcerias com a indústria farmacêutica para continuar o desenvolvimento desses novos fármacos”, afirma Jorge Menezes. 

Sobre o processo de registro de novo medicamento, Aluísio Marques elucida: "como só realizamos o depósito da patente, há a necessidade de parcerias nas indústrias farmacêuticas a fim de que os demais processos de desenvolvimento de novos fármacos sejam realizados até que este se torne um medicamento".  

 “A descoberta oferece uma alternativa inovadora aos ansiolíticos convencionais e pode mudar a forma como tratamos o transtorno de ansiedade no futuro”, afirma Jorge Menezes. A próxima etapa, segundo ele, é "atrair investidores que possam subsidiar a continuidade da pesquisa, que é pioneira envolvendo tais sistemas químicos".  

GMF  

O Grupo de Materiais Fotônicos (GMF), da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB), Campus Amargosa, foi criado em 2010, pelo professor Jorge Fernando Silva de Menezes, líder do grupo de pesquisa. É registrado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e certificado pela IES. Os trabalhos realizados no grupo envolvem a colaboração de pesquisadores do Brasil e do exterior. 

Todos as pesquisas são feitas com a participação de estudantes da UFRB/CFP principalmente nas modalidades Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC) e Programa Institucional de Bolsas de Iniciação em Desenvolvimento Tecnológico e Inovação (PIBITI), com bolsas de órgãos de fomento tais como CNPq, FAPESB e a própria UFRB.

O GMF tem produzido materiais com uma diversidade de aplicações, nos últimos 14 anos. Nessa trajetória, muitos estudantes de graduação puderam, sob orientação do professor e líder do grupo de pesquisa, desenvolver estudos com materiais do tipo complexos de coordenação com os elementos terras raras, que incluem escândio (Sc), ítrio (Y) e os elementos da série dos lantanídeos (La-Lu), notadamente európio (Eu) e térbio (Tb).   

Os elementos terras raras, que recebem esse nome pela dificuldade nos processos de separação e não necessariamente pela escassez, estão envolvidos em relevantes questões geopolíticas pela sua relevância no mercado de dispositivos optoeletrônicos, cerâmicas, catalisadores, craqueamento de petróleo, dispositivos magnéticos e indústria metalúrgica.  Os compostos de coordenação com tais metais são amplamente utilizados em uma série de aplicações relacionadas ao desenvolvimento tecnológico, pelas propriedades únicas que esses elementos possuem.   

Nos anos recentes, Jorge Fernando tem direcionado o esforço na produção de materiais a partir de fármacos e moléculas bioativas, com fim de projetar complexos com capacidade farmacológica de interesse da indústria farmacêutica e, principalmente, para contribuir com a sociedade. 

Assim nasceu o projeto que culminou na patente, onde nove materiais foram sintetizados, caracterizados físico - quimicamente e, em parceria com pesquisadores das universidades cearenses (UVA, UECE e Unilab), entre eles, o mestrando oriundo da GMF Andrei Marcelino Sá Pires Silva, da UESC,  que seguem em um incessante esforço na pesquisa em farmacologia e compostos bioativos, os complexos foram testados quanto à atividade farmacológica, mais especificamente quanto à atividade ansiolítica, que gerou promissores resultados.   

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